O texto a seguir é parte do livro “Escritas do Cotidiano no CMET Paulo Freire“, publicado pela Cirkula, Porto Alegre. 2024.
Um dos diferenciais do CMET Paulo Freire é trabalhar exclusivamente com Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Ensino Fundamental nos três turnos: manhã, tarde e noite. Por ser uma das únicas instituições de EJA gratuitas com essas características é muito procurada por estudantes de todas as regiões de Porto Alegre e da Região Metropolitana. O CMET atende jovens a partir de 15 anos, adultos e idosos, incluindo pessoas com deficiência física e mental. Outra característica desta instituição é que além das disciplinas curriculares obrigatórias de EJA, oferece também disciplinas eletivas tais como: Jogos Lógicos, Xadrez, Esportes Diversos, Produção de Texto, Cinema, Literatura, Informática, Ciências Naturais, entre outras. Mantém ainda um Centro Musical que oferece gratuitamente cursos e oficinas de canto e diferentes instrumentos. Foi nesse contexto que vi a oportunidade de implantar a Biodança no currículo diversificado da instituição e o fiz em 2019 através da vivência pedagógica “Corpo e Afetividade” e atualmente (2023) é a disciplina eletiva “Biodança, Corpo e Afetividade”. Mas afinal, o que é Biodança?
A Biodança foi criada por Rolando Toro3 a partir de um conjunto de estudos interdisciplinares, bebendo de fontes da Biologia, da Psicologia, da Antropologia, da Fisiologia, da Teoria Musical, da Dança, entre outras. Uma das definições mais famosas de Biodança é:
Biodanza é um sistema de integração humana, renovação
orgânica, reeducação afetiva e reaprendizado das
funções originárias da vida. Sua metodologia consiste
em induzir vivências integradoras por meio da música,
do canto, do movimento e de situações de encontro em
grupo (TORO, 2002, p. 16).
Para quem não conhece Biodança, essa definição é muito difícil de entender. Conforme descrevo as aulas que facilitei ficará mais fácil compreender como funciona. No site da IBFed4 (International Biodanza Federation) “integração humana” se refere ao processo de estimulação das funções primordiais de conexão com a vida, buscando uma integração consigo mesmo, com o outro da mesma espécie e com o ambiente/universo. A “renovação orgânica” seria a ação sobre a autorregulação orgânica, induzidas por estados de transe que ativariam processos de renovação celular e regulação global das funções biológicas, diminuindo a desorganização e o estresse. A “reeducação afetiva” tem a ver com a capacidade de estabelecer vínculos afetivos com as outras pessoas. A “reaprendizagem da função da vida” refere-se à integração dos instintos (que representam a natureza em nós) tão reprimidos pela nossa cultura. Devemos fazer uma religação entre a nossa natureza e a cultura. As “vivências integradoras” são experiências vividas com grande intensidade no aqui e agora que projetaria toda a sua existência (qualidade ontológica) e possuiriam um efeito harmonizador em si mesmas.
Segundo a teoria da Biodança os seres humanos deveriam desenvolver seus potenciais genéticos através de cinco linhas de vivências: vitalidade (aumento da alegria de viver,
ímpeto vital, energia disponível para a ação, integração motora, equilíbrio neurovegetativo); sexualidade (despertar a fonte de desejo, aumento do prazer, conexão com a identidade sexual, diminuição da repressão sexual); criatividade (capacidade de expressar, inovar e construir); afetividade (capacidade de criar vínculos com outras pessoas através do amor,
amizade, altruísmo e empatia) e transcendência (conexão com a natureza, sentimento de pertencer ao universo). Ao ser entrevistado sobre como a Biodança daria conta do sentido de transcendência que a dança tem em todas as comunidades humanas, Rolando respondeu:
La Biodanza tiene una de sus líneas de desarrollo llamada trascendencia. Trascendencia para obtener estados de expansión de conciencia, de vínculo con la naturaleza, de sentimiento de totalidad con el cosmos, de éxtasis y
contemplación de la belleza del mundo. Y tenemos, por lo menos, cien ejercicios y músicas. La trascendencia es parte del programa de Biodanza. Así es que los que quieren vivir la Biodanza tienen que vivir la vitalidad, el erotismo, la creatividad, la afectividad y la trascendencia, esos cinco caminos5 (TORO, 2007, p.113).
Rolando Toro falava dos “doentes da civilização” e apontava nossa cultura como violenta e geradora de diversas doenças. Segundo o autor, uma das principais mudanças para melhorar o mundo viria através da educação. Criticava os currículos e apontava como uma questão central o afeto na educação, o desenvolvimento da motivação e da criatividade, tendo a vida como valor fundamental. Dalla Vecchia (2005) analisa o papel da afetividade no processo educativo e na construção do conhecimento na obra Pedagogia da Autonomia de Paulo Freire, dando destaque ao papel que ocupa a afetividade no processo vivo de construção de uma educação engajada, politizada, ética e crítica. Desta forma mostra como as pedagogias de Toro e Freire tinham pontos em comum, principalmente na questão da afetividade. Segundo o autor:
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Carla Patrícia Pintado Núñez é Licenciada em Letras Espanhol/Português e Ciências Sociais. Mestre em Educação pela UFRGS. Professora de Língua Espanhola no CMET Paulo Freire. Facilitadorta de Biodanza e Presidente da Associação Gaúcha de Biodança (AGB gestão 2023-2024). E-mail: [email protected]