Por quê J’ai Pleuré e não eu chorei? Porque me parece, que a dor em Francês se mostra mais romantizada, com certeza chorar em Paris deve ser menos doloroso com todo o cenário ao nosso redor, seja no Rio Sena, na Torre Eiffel, em Montmartre ou em Sacre Couer…
Pois nesta semana, rompi em prantos pela perda de um gatinho, aliás, não era um simples “gatinho” foi um gato que me acompanhou por quatorze anos, Smigol, se mostrou “precioso” desde que chegou, pois veio sozinho filhotinho, arisco e miando sem parar no meu portão até eu coloca-lo para dentro, “Se um gato aparecer em sua vida, acolha-o, pois ele veio com alguma missão”. (autor desconhecido)
Chegou dizendo a que veio arisco, brigão e um grande caçador, só era amoroso comigo e trazia presentes bem difíceis de aceitar (ratos, cobras, passarinhos, rãs e até um calango). Esperava-me no portão, como um cão de guarda, e não permitia nenhum outro gato da rua se aventurar por casa, assim como não gostava de visitas humanas e intimidades consigo. A ida ao veterinário ou administração de medicamentos era uma missão quase impossível.
Mas, o que este gatinho tão especial tem em comum com nosso processo de envelhecimento? Ele envelheceu comigo, numa velocidade bem maior do que o meu processo de envelhescência e fomos percebendo um no outro nossas limitações, muito mais eu percebendo seu processo do que ele percebendo o meu.
Quando completou um ano, já representava sete anos de vida, aos dois era um jovem adolescente de 14 anos, ativo de olhos brilhantes e pelo saudável, aos seis anos, era um jovem senhor de 42 anos, já mais calmo, menos aventureiro, aos oito anos não era mais tão impetuoso, menos arrojado e mais caseiro.
Paralelamente, desde meus cinquenta um anos, fui envelhecendo com ele, sem perceber, de uma jovem senhora passei a ser uma pessoa idosa, e as dificuldades para ele subir nos móveis ou em lugares mais altos, me reportavam também a perda de minha massa muscular. Suas dores e comportamento mais caseiro me mostravam que eu não devia ir por esta linha de envelhecimento, embora a vontade de ficar mais tempo em casa, recolhida com meus gatos e afazeres, se fizesse mais presente.
E agora quando penso sobre o que me fez desintegrar chorando, refleti sobre todos os lutos não vividos ao chegar até aqui, aqueles lutos e dores que nos ensinaram a ser forte para não demonstrar com tanta emoção o que nos afeta interna e verdadeiramente com as cenas da vida real.
Então eu chorei pelas perdas e sofrimentos cotidianos, acumulados em sessenta e cinco anos de vida; a perda da juventude, a perda de alguns amigos, do status profissional perante aposentadoria, os divórcios, a perda dos filhos crianças, a tristeza ao observar um idoso dormindo na rua, juntando latinhas para vender, a impotência perante crianças descalças vendendo ou pedindo nas sinaleiras, o descaso com a vida animal, o desamparo de ninhadas de filhotes largados na rua como se objetos fossem a ser descartados, as queimadas no país, as calamidades e todos aqueles que sofrem..
Este choro me remete à criança chorona que fui, que era obrigada por vezes, a engolir o choro, mesmo estando muito triste, pois era considerada uma criança “manheira” e ainda agora meus olhos ficam marejados de lágrimas ao pensar no quanto somos obrigados a ser fortes quando gostaríamos de ficar encolhidos num canto, feito meu gatinho quando adoeceu, embora liberar nossas emoções também seja um sinal de força interior.
Nosso processo de envelhecimento nos alerta sobre a falta de atenção, ao desrespeito, a perda da identidade como uma pessoa capaz de superar suas fragilidades, e mesmo assim segurar suas emoções e apresentar-se como fortalezas, sem receio de externar o medo do futuro, e mostrarmos que não somos mais crianças frágeis e sim, idosos fragilizados pela vida.
Por isto, J’ai pleuré, pour mon chat gris…